domingo, 29 de março de 2009

A VIDA ESCANDALOSA DOS BEATLES - PART III

Talvez o fato de Yoko Ono ter sido a pessoa que estava ao lado de John Lennon quando ele mergulhou de cabeça no mundo das drogas tenha contribuído para que todas as demais pessoas, além de Paul, George e Ringo, ligadas aos Beatles não a amassem, o que imediatamente levou John a entrar numa de que todas a odiava. Isso fatalmente provocaria uma separação. Mas não se pode dizer que tenha sido o elemento único – talvez nem mesmo o preponderante. Pressões comerciais, com as quais eles tiveram que lidar mais diretamente desde que seu empresário Brian Epstein morrera, e desgaste artístico minaram os Beatles, e o LP Abbey Road, que alcançou um tremendo sucesso de vendas, foi na verdade o último produto legítimo dos Beatles como conjunto homogêneo. Quando Let It Be foi feito, a dissolução já era iminente, e ao ser lançado praticamente já não havia mais Beatles. Uma coisa é certa: John e Paul foram as principais forças de ruptura do conjunto, enquanto George e Ringo permaneceram como uma espécie de mediadores nas intermináveis questões que se sucederam entre eles num curto espaço de tempo, a partir de 1969. John e Yoko se metiam nas mais fantásticas aventuras – e fantásticas aí quer dizer mais inacreditáveis do que fabulosas. Faziam declarações confusas aos jornais a respeito de seus projetos de luta pela paz mundial, apoiavam os Panteras Negras, promoviam artistas de vanguarda menores, e acabaram caindo no descrédito geral diante da imprensa. A nível privado as coisas não iam melhor.
Se havia um fato positivo – as tentativas, que acabariam por ser bem sucedidas, de John deixar o vício dos tóxicos -, este era contrabalanceado pelo evento negativo dos sucessivos abortos de Yoko, que lutava para ter um filho de John. Ela obviamente se sentia atingida pelo fato de Cynthia ter ao seu lado o pequeno Julian, permanente elo de ligação com o pai do menino.
Posteriormente Yoko seria agraciada pelo destino com seu próprio bebê, Sean. Mas enquanto isso não acontecia, um episódio foi sintomático de como as coisas estavam acontecendo naquela época. John descobrira as teorias do Dr. Arthur Janov, um dos mais proeminentes terapeutas da chamada new wave em psiquiatria, através do livro que este escreveu, Grito Primal, Terapia Primal A Cura da Neurose. Ele e Yoko, graças a sua fama e fortuna, conseguiram trazer o famoso médico da Califórnia para Londres, onde passou um mês dedicado somente a eles. Foi uma panacéia, mas teve o inestimável valor de despertar em John a vontade de se curar. Após um mês de terapia particular, Dr. Janov convenceu o casal a ir com ele para a Califórnia, para o Primal Institute, em Los Angeles. Os problemas de John com a imigração norte-americana seriam facilmente resolvidos pelo Dr. Janov. Um dos poucos meios que ele teria para poder entrar e permanecer nos EUA era para tratamento médico especializado.
Pouco antes de John e Yoko partirem para a Califórnia, Janov sugeriu que seria bom para a terapia de John se ele resolvesse, um pouco que fosse, o problema de seus sentimentos ambivalentes para com o filho Julian, a quem ele amava, mas ao mesmo tempo rejeitava, uma vez que, para viver sua própria vida com Yoko, ficava meses sem se quer ver o menino. Foi combinado um encontro, e John foi sozinho, em seu Rolls-Royce, até a casa de Cynthia, em Kensington, visitar o filho. “Ele foi surpreendentemente agradável”, relembra Cynthia. “John subiu quase que imediatamente para o quarto de Julian, onde ficaram durante muitas horas brincando juntos. Eu estava radiante, e Julian mais ainda. Mais tarde, John desceu para tomar uma xícara de chá comigo e me contar seus progressos com a terapia primal. Yoko não foi mencionada um só momento. Exatamente aí o telefone tocou. Era a governanta da mansão de John em Tittenshurst Park, histérica porque Yoko estava ameaçando tomar uma superdose de pílulas para dormir porque John estava passando tempo demais comigo e com Julian. John bateu com telefone e gritou: ‘Aquela maluca está ameaçando se matar.’”
Depois disso, todas as comunicações e determinações a respeito de Julian foram feitas através de Yoko Ono. Cynthia nunca mais ouviu o som da voz de John ao vivo.
Se a terapia primal acabou não sendo o elixir mágico que John buscava, foi uma das poucas coisas na época que lhe deixaram valores positivos e uma verdadeira melhora pessoal. A terapia primal o pôs mais em contato com os seus medos e fúrias, com as cargas que ele vinha trazendo nas costas durante toda a vida. Ser capaz de lidar com seus sentimentos de forma tão explícita liberou o artista dentro dele, e muitas vezes ele voltou às telas e pincéis para traduzir suas emoções em termos que entendia melhor. Os resultados são evidentes no primeiro álbum-solo de John, o chamado LP “primal”, John Lennon/Plastic Ono Band. Este álbum foi uma das obras autobiográficas mais poderosas e eficientes produzidas, em qualquer mídia, por um artista moderno. John utilizou o estúdio para um exorcismo musical. De todo LP, a música que fez maior sucesso comercial foi uma canção chamada God (Deus), uma litania simples das desilusões de John. Ele canta:

“I d'ont believe in" Jesus...
“I don’t believe in" Bible...
“I don’t believe in" Elvis...
“I don’t believe in" Beatles... “I just believe in me...The dream is over"

(Eu não creio em Jesus...não creio na Bíblia...não creio em Elvis...não creio nos Beatles...só creio em mim. O sonho acabou.)

Durante todo aquele ano (1969) Paul acompanhou as aventuras de John e Yoko pelos jornais, com um crescente sentimento de consternação e desgosto. John estava fazendo papel de tolo, e era tempo de Paul romper. Uma vez que era tolice continuar a pensar que um dia viesse a haver um outro álbum dos Beatles. Paul decidiu que o primeiro passo no sentido de uma ruptura seria fazer seu próprio álbum, e naquele outono resolveu se retirar para a sua fazenda na Escócia, a fim de fazer lá mesmo suas gravações. Em março de 1970, quase seis meses depois, ele voltou para Londres com o disco – McCartney – pronto. Assim que chegou telefonou para John. “Estou fazendo o que você e Yoko estão fazendo”, disse ele. “Estou soltando meu próprio álbum e deixando o grupo.” John não podia acreditar qua Paul ainda pensasse sequer que havia um grupo para deixar. “Ótimo”, respondeu John. “Com isso já somos dois a aceitar a coisa mentalmente.”

Julian, o filho de John com Cynthia, nunca pôde conviver muito com o pai. Primeiro foram as eternas turnês. Depois foi Yoko que se colocou entre eles, com ciúmes. Ele nem conhece o irmão, Sean, filho de Yoko.

A gravação de Let It Be foi o último momento profissional dos Beatles juntos, sempre com a presença de Yoko, o que irritava muito os demais Beatles.
Paul então informou a mim (Peter Brown) e a Allen Klein que, por motivos pessoais, ele queria esse álbum lançado no dia 10 de abril, pela Apple. Klein explicou que 10 de abril era impossível. Em 10 de abril seria o lançamento de Let It Be. Phil Spector fizera um trabalho tão bom para o compacto de John Instant Karma que John e Klein deram a ele todas as empoeiradas fitas de Let It Be, que estavam guardadas num cofre há mais de um ano, para que ele fizesse um álbum com elas. O álbum seria solto a tempo para acompanhar o documentário Let It Be, já pronto, e que estrearia nos cinemas em 20 de maio.
Uma vez que era um filme da United Artists, a data não podia ser mudada. E Ringo também gravara um álbum solo, chamado Sentimental Journey, que deveria ser lançado depois de Let It Be.
Paul teria que esperar na fila.
Paul telefonou enfurecido para Sir Joseph Lockwood, da EMI.”Estou sendo sabotado, Sir Joe, é isso que eles estão fazendo comigo!” Sir Joe disse que faria o possível para ajudar, mas a decisão, afinal, teria que caber aos outros Beatles.
Uma noite Ringo foi ver Paul na casa em St. John’s Wood. Ringo era o menos inflamável de todos e o melhor mediador para conseguir algum tipo de acordo. Fazia poucos minutos que Ringo estava na casa de Paul, quando este se enfureceu e, de acordo com Ringo, ficou totalmente fora de controle. Sacudiu o dedo na cara de Ringo e gritou: “Vou acabar com você todos! Vocês hão de pagar!” Deu a Ringo seu casaco e o botou para fora de casa. Ringo, rapaz razoável que é, disse aos outros que, se era tão importante para Paul ter seu álbum solo lançado em abril, eles então que deixassem, só para demonstrar amizade. O próprio álbum de Ringo foi posto para depois e o lançamento de Let It Be antecipado. No final, os três álbuns chegaram ao mercado com três ou quatro semanas de distância um do outro, inundando as paradas com produtos dos Beatles. Foi uma péssima decisão mercadológica. Paul estava zangado, mas não tão zangado quanto ele ficaria quando, eventualmente, ouviu o álbum Let It Be. Spector arrasara completamente com o som dos Beatles. Apesar de ter certos méritos, Let It Be era puramente uma pura amostra da Phil Spector Wall of Sound Production, com seus inimitáveis fundos de coros imensos e orquestrações prolixas. Paul ficou mortificado com aquelas vozes femininas tão kitsch – as primeiras vozes femininas, que jamais apareceram num disco dos Beatles – e com o que Spector fizera com uma de suas mais belas canções, The Long and Winding Road. Paul originariamente gravara a canção apenas com uma guitarra acústica, do mesmo modo como cantara a canção no documentário da United, usando apenas a doçura de sua voz para levar a
melodia. Spector a transformara numa pilha monumental de pieguice, completando-a com cordas, metais e um coro etéreo no fundo.

Paul McCartney está está vivo e passando bem, gravando um disco em sua fazenda na Escócia

Quando Paul McCartney resolveu se retirar para sua fazendo na Escócia, em 1969, a fim de gravar seu próprio LP, fez questão de manter em segredo sua partida e o motivo pelo qual estava entrando “de férias”. Isso teve um efeito mórbido inesperado. A 12 de outubro, um disc-jockey americano, chamado Russ Gibb, na estação WKNR-FM de Detroit, disse ter recebido um telefonema anônimo contando que Paul McCarteney tinha morrido. A prova, segundo ele, em parte poderia ser obtida no final da canção Strawberry Fields, do LP Seargent Papper, que, tocada de trás para frente, podia ser decifrada como John dizendo “Eu enterrei Paul”. Por mais que, na época, esse pudesse ser o sentimento de John, ainda assim não era verdade. Pouco depois dessa transmissão, a mesa telefônica da Apple, em Londres, ficou congestionada com telefonemas de agências noticiosas do mundo inteiro, de repórteres locais e de fãs que queriam saber se era mesmo um fato que Paul estava morto. Garantimos a todos que ele estava vivo, em bom estado de saúde e se divertindo, mas, para proteger sua privacidade, não queríamos dizer exatamente onde ele se encontrava. Mas isso só fez aumentar a confusão em torno de seu destino e de seu paradeiro. Derek Taylor, afinal, teve que admitir que ele tinha ido para sua fazendo na Escócia. Eu chamei Paul através de sua linha telefônica privada na fazenda e contei tudo a ele. Perguntei o que ele queria fazer a respeito, e ele disse: “Nada, deixe rolar.” E foi o que eu fiz. Mas em poucos dias a situação estava ainda pior, e voltei a telefonar, dizendo-lhe que precisávamos fazer uma declaração, ou de alguma forma provar que os rumores não faziam sentido. Paul estava determinado. Não ia dizer nada, ia ficar na Escócia, e isso era tudo. Mas não foi o bastante para a revista Life, cujos editores se determinaram em obter a prova fotográfica de que Paul não morrera, e mandaram um time de repórteres e fotógrafos à Escócia, para seguir a pista dele e obter pelo menos uma fotografia. Com muito sacrifício, o grupo conseguiu se esgueirar até as proximidades da casa da fazenda, mas foram detectados por Martha, a cadela pastora inglesa de Paul, cujos latidos fizeram com que ele aparecesse correndo. Enfurecido com a invasão tão descarada de seu lar, Paul gritou com os repórteres que foram embora, mas eles começaram a bater fotos dele gritando. Isso o enfureceu ainda mais. Paul estava segurando um balde d’água, e atirou-o sobre os fotógrafos, que bateram fotos disso também. Pouco depois de eles terem partido, Paul parou e pensou no que fizera. Arrependido, pulou em seu jipe e correu atrás deles. Alcançou-os no caminho para a cidade mais próxima, e parou para conversar, parlamentar. Usando de todo o seu habitual charme, ele se desculpou e perguntou se eles aceitavam um acordo: em troca dos filmes que tinham acabado de bater de sua explosão temperamental ele lhes daria uma entrevista exclusiva, além de fotos exclusivas dele com sua filha recém-nascida, Mary – fotos tiradas pela fotógrafa da família, Linda Eastman, mulher de Paul. Essa entrevista e as fotografias foram a matéria de capa do número seguinte de Life.

Paul tentou tudo que pôde para mudar a coisa, mas era tarde demais, o disco já estava sendo prensado.
Essa heresia com seu trabalho foi a última gota.
A 20 de maio, na estréia de gala de Let It Be, no Palladium de Londres, nenhum dos Beatles apareceu. Ao invés de um filme sobre a realização de um álbum, foi o retrato de dissolução de um grupo. Ainda mais doloroso: foi o retrato da dissolução de uma amizade em animosidade e até eventual ódio. Naquela mesma noite, George Harrison foi para os estúdios com Phil Spector e começou o que seriam seis meses de trabalho em seu próprio álbum solo, All Things Must Pass. Para não ficar de fora, Ringo também começo a trabalhar em seu LP seguinte, Beaucoup of Blues, que levou seis dias, em vez de seis meses, para ser gravado.
Em 17 de abril o LP solo de Paul, McCartney, com cerejas na capa, foi lançado. Dentro, uma entrevista dele com ele mesmo, que deixava uma mensagem irrefutável: os Beatles estavam mortos. Uma semana antes, Paul anunciara aos jornais o que John desejara dizer durante todo aquele tempo: ele estava deixando os Beatles, “por causa de diferenças pessoais, comerciais e musicais.”
Ele deve ter se lembrado, nesse momento, de uma tarde, no final do verão anterior (setembro de 1969), em que John, recém-chegado de uma turnê no Canadá, convocou um encontro com na Apple. Paul chegou, como de hábito cheio de planos para os Beatles. Começou a falar de seus projetos. Não importa o que ele sugerisse, John só dizia: “Não, isso eu não quero”, ou “Não, não me interessa”. A discussão acabou numa briga enorme, que Paul tentou cortar dizendo: “No fim das contas, depois de tudo dito e feito, ainda somos os Beatles, não somos?” “Ah, não***”, disse John. “Eu não sou Beatle nenhum.” Paul não podia acreditar. “É claro que você é...” “Não sou!”, gritou John. “Será que você não entende? Está acabado. Acabado! Eu quero o divórcio, tal como me divorciei da Cynthia! Será que isso não entra nesse diabo dessa cabeça?” O encontro terminou em seguida, com John saindo escadaria abaixo – Yoko atrás dele -, gritando: “Está acabado! Encerrado!” Ainda assim, John não disse nada aos jornalistas, e, quando ele e Yoko deram a partida em seu Rolls-Royce branco, Paul achou que ele logo se acalmaria, e que sempre haveria os Beatles. Afinal, coube a Paul contar à imprensa primeiro, sete meses depois.
Em 23 de outubro de 1980, um guarda de segurança de 25 anos, chamada Mark David Chapman, assinou a saída de seu trabalho num grande condomínio de Honolulu, no Havaí. O nome que ele assinou foi “John Lennon”. Mais tarde, naquele mesmo dia, ele telefonou para o seu agente de emprego e se demitiu. “Você está procurando alguma coisa?” Ele perguntou.
“Não”, disse Mark, “Já tenho um trabalho para fazer”.
Na superfície, Mark Chapman era igual a milhões de outros garotos que adoraram John Lennon e os Beatles enquanto cresciam. Não havia meio de se prever que um dia a personalidade dele se partiria e ele se transformaria em duas pessoas, ele mesmo e John Lennon, e então sentiria a compulsão de reduzir o número para um novamente. Chapman se encaixa no perfil psicológico de vários assassinos de presidentes.
São homens de muito baixa auto-estima, amargamente desapontados com suas próprias vidas. Ligam-se a heróis com o que p historiador Christopher Lash chamou de “intimidade mortal”, primeiro como fã, depois como imitador, inevitavelmente como assassino.
Chapman nasceu em 10 de maio de 1955, em Fort Worth, Texas, filho de um sargento da reserva da força aérea, mas cresceu num subúrbio de Atlanta, Geórgia, onde o pai trabalhava como gerente de crédito num banco de Atlanta. Chapman foi um adolescente típico, médio, tranqüilo, cujos interesses iam de discos voadores aos Beatles. Ele amava os Beatles, para inquietação dos pais, amava demais, e deixou crescer o cabelo, além de aprender a toca guitarra. No segundo grau ele juntou-se a um conjunto local e trabalhou como conselheiro na filial de South DeKalb da ACM.
Sua aspiração era tornar-se diretor da ACM (Associação Cristã de Moços).
Mas em 1969 Chapman sofreu uma transformação radical. Iniciado em drogas psicodélicas na escola, ele tomou todo tipo de alucinógenos que conseguia encontrar, e freqüentemente tinha viagens horríveis. Os pais tentaram pôr um ponto final naquilo, mas o único resultado é que Chapman fugiu, ficando fora durante duas semanas. E então, tão repentinamente quanto começara, a coisa parou, e Chapman tornou-se um desses “fanáticos de Jesus”, com quinze anos de idade. Vendeu seus discos dos Beatles, cortou o cabelo, botou uma camisa branca e uma gravata preta, e passou a usar uma grande cruz de madeira no pescoço. Os amigos lembram de ouvi-lo recitar passagens da bíblia, que ele a partir de então carregava onde quer que fosse. Na escola, ele passava o tempo todo livre estudando a bíblia, e em encontros de oração Chapman uma vez renunciou aos Beatles, porque John Lennon declarara que eles eram mais populares que Jesus.
A canção Imagine tornou-se uma das vítimas favoritas desse grupo de oração, e eles a cantavam mudando os versos para “Imagine que John Lennon está morto”.
Após se formar, Chapman inscreveu-se no DeKalb Community College durante um curto período, e depois abandonou os estudos. Foi fazer trabalho de campo na ACM durante algum tempo, até que um amigo lhe disse que havia um emprego full-time disponível na ACM de Beirute, capital do Líbano. Chapman ganhou dinheiro para a passagem aérea levando carros e fazendo pacotes em armazéns, e partiu por volta de junho de 1975. Não fazia duas semanas que ele estava no Líbano, quando começou uma terrível guerra civil, e ele
Teve que ser evacuado, com outros norte-americanos. Ele gravou o som dos canhões num gravador cassete antes de partir e ficava tocando a fita repetidas vezes para os amigos, de volta a Atlanta.
Foi mais tarde, ainda nesse ano, que ele se apaixonou por uma bela garota, com longos cabelos compridos, chamada Jessica Blankenship. Foi um relacionamento unilateral, e Chapman fez todo tipo de coisas para impressioná-la, inclusive mandando escrever “Feliz Aniversário, Jessica” na marquise do Holiday Inn local. Ele até se inscreveu no Covenant College, uma escola presbiteriana muito rígida, para impressioná-la. Seu sonho era que os dois se tornassem missionários cristãos e fossem viver em algum lugar exótico. Mas o Covent College era muito duro para ele, e quando ele desistiu, Jessica o encarou como um fracassado. Um emprego no centro de refugiados vietnamitas de Fort Chafee, no Arkansas, aliviou seu espírito temporariamente, mas quando isso também acabou, em dezembro de 1975, ele estava perdido.
Em 1977 ele se mudou para o Havaí, onde a mãe tinha ido viver após se divorciar do pai dele. Pouco depois de sua chegada, Chapman tentou se suicidar aspirando a fumaça do cano de descarga de um automóvel. Foi encontrado a tempo e hospitalizado para tratamento psiquiátrico no Castle Memorial Hospital, mas logo foi dispensado. Mais tarde trabalhou na ACM local e no próprio Castle Memorial. Em 1979, com um pouco de dinheiro que o pai lhe mandara, fez uma viagem pelo mundo e visitou várias ACMs, em Tóquio, Hong Kong, Bagcoc, Paris e Londres.
Antes de voltar para o Havaí, em junho de 1979, casou-se com Gloria Abe, uma japonesa quatro anos mais velha do que ele, que marcara todas as suas viagens para a volta ao mundo na agência de viagens local. Apesar de ele ter apenas um emprego de quatro dólares por hora como guarda de segurança, conseguiu tomar emprestado num banco dinheiro suficiente para colecionar litografias. A primeira foi de Salvador Dali, chamada Lincoln in Dalivision, que Chapman comprou por cinco mil dólares. Mais tarde trocou-a por uma litografia de Norman Rockwell, intitulada Triplo Auto-Retrato.
A essa altura alguma coisa transformara Chapman num jovem pesadão,, irascível. Era seco e não se relacionava com os colegas de trabalho, e desenvolveu um súbito interesse por armas de fogo. Em casa tornou-se terrível para com a mulher, proibindo-a de ouvir rádio ou ler jornais.
Uma vez o viram no trabalho usando um crachá de identificação com o nome “John Lennon” escrito a maquina e colado em cima do dele próprio. Mas não havia que Mark David Chapman jamais tivesse dito ou feito que levasse alguém a acreditar que ele ia matar John Lennon.
Num dia qualquer de outubro, Chapman leu o mais recente número de Esquire, o que trazia John Lennon como história de capa. O artigo, uma peça de não-jornalismo, em busca de um entrevistado que se recusara a ser entrevistado ou a cooperar, retratava Lennon como “um homem de negócios quarentão, que vê televisão um bocado de tempo, que possui 150 milhões de dólares (250 milhões de dólares, segundo a Fortune, outra revista), um filho que ele idolatrava e uma mulher que interceptava seus telefonesmas”.
John se acabara. “Esse fingido”, pensou Chapman.
Em 27 de outubro de Chapman entrou na J&S Sales Ltd., em Honolulu, e comprou um Charter Arms, um revólver calibre 38 especial. Ele se inscrevera para obter uma licença particular de porte de arma no começo daquele mês, alegando seu trabalho como guarda de segurança, e não teve problemas em conseguir o revólver. Em novembro Chapman fez uma peregrinação e Atlanta, Geórgia, para ver os pais e os amigos. E depois foi para Nova Iorque. Passou uns poucos dias no hotel Waldorf Astoria, em Park Avenue, antes de se registrar no hotel Olcott, perto do edifício Dakota, onde John e Yoko moravam, e que servira de cenário para Roman Polansky filmar O Bebe de Rosemary.
Chapman, segundo se diz, mais tarde contou a um ministro religioso que, durante esse período, esteve lutando com espíritos “bons” e “maus”.
Evidentemente os bons espíritos venceram, naquele momento, porque Chapman de repente embarcou num avião para Atlanta, ficando na cidade somente alguns dias, antes de voltar para casa, no Havaí. Finalmente, dirigiu-se de novo para Nova Iorque, em 5 de dezembro. O total de suas viagens, a essa altura, já o fazia percorrer mais de 20 mil quilômetros.
Na primeira noite ele se registrou na ACM da rua 63, a apenas nove quarteirões ao sul do Dakota, e depois no Sheraton Centre Hotel, na rua 52 com a Sétima Avenida. No dia seguinte ele ficou de vigília diante do Dakota. Levava nos bolsos algumas fitas cassete dos Beatles, um exemplar de O Apanhador no Campo de Centeio, de J. D. Salinger, e seu revólver 38. Chapman não foi notado na mudança de guarda, nem pelos fãs que costumam ficar esperando do lado de fora do Dakota, à espera de que Lauren Bacall ou Gilda Radner (ou John Lennon e Yoko Ono) passem.
Aquela segunda-feira, 8 de dezembro, era um dia de inverno estranhamente quente para Nova Iorque, dia perfeito para ficar esperando em frente ao Dakota que alguma celebridade passasse. Ninguém tem muita certeza sobre quanto tempo Mark Chapman ficou lá naquele dia. Quando John e Yoko saíram, às cinco da tarde a limusine de John estava estacionada no meio-fio, em vez de estar dentro dos portões de entrada do Dakota, e quando ele se dirigiu para o carro, Chapman estendeu-lhe um exemplar do novo álbum de Lennon, Double
Fantasy, e John, sem podr fazer outra coisa, parou e autografou a capa para ele: “John Lennon, 1980”. Outro fã correu e tirou uma foto. Mark Chapman estava estático, enquanto John e Yoko entravam na limusine e saíam. “Eu estava com o chapéu na cabeça ou não?”, perguntou ele, muito excitado. “Espero que não estivesse de chapéu. Rapaz, nunca vão acreditar nisso lá no Havaí!” John e Yoko voltaram ao Dakota às 10h50min da noite, de limusine, com John carregando nas mãos as fitas de Caminhando sobre Gelo Fino. Os altos portões de segurança ainda estavam abertos, mas novamente a limusine parou junto ao meio-fio, e John teve que caminhar pela calçada. Yoko cruzou o portão de entrada na frente dele. Assim que passaram para a parte obscura da arcada do prédio, John ouviu uma voz que o chamava: I”Me. Lennon?” John se virou procurando, míope, na escuridão. A um metro e meio de distância, Mark Chapman já estava em posição de tiro. Antes que John pudesse falar, Chapman disparou cinco tiros nele.
Yoko ouviu os tiros e se virou. A princípio ela não se deu conta de que John tinha sido atingido, porque ele continuou caminhando em direção dela. Então ele caiu de joelhos e ela viu o sangue. “Fui baleado!”, gritou para ela, antes de cair de cara diante do escritório de segurança do Dakota. O porteiro do famoso edifício, um rapaz barbudo de 27 anos, chamado Jay Hastings, saiu de trás da escrivaninha e se precipitou para onde John estava caído com o sangue jorrando pela boca, o peito cheio de ferimentos. Yoko segurou a cabeça de John, enquanto Hastings tirou o casaco azul de seu uniforme e o colocou sobre ele. John estava semiconsciente e, quando tentou falar, engasgou e vomitou matéria orgânica. Enquanto a polícia era chamada, Hastings correu para o lado de fora, em busca do pistoleiro, mas não teve que ir muito longe. Chapman estava parado calmamente diante do Dakota, lendo seu exemplar de O Apanhador no Campo de Centeio. Jogara o revólver no chão depois de atirar. “Você sabe o que acaba de fazer?”. Perguntou Hastings. “Eu acabo de atirar em John Lennon”, disse Chapman, sempre calmamente. Yoko gritou histérica até a polícia chegar. O primeiro a se apresentar no local foi o patrulheiro Anthony Palma. Contra a vontade de Yoko, ele virou John de costas. “Vermelho foi tudo que vi”, disse Palma. “O cara está morrendo. Vamos tirá-lo daqui.” A essa altura, o carro de patrulha da polícia já tinha chegado, e Palma e o oficial James Moran puseram John no assento traseiro. Partiram para o Roosevelt Hospital, com as sirenes berrando. Yoko seguiu num segundo carro da polícia, repetindo o tempo todo: “Não é verdade, digam que não é verdade!”
A caminho do hospital, o oficial Moran olhava para John Lennon em seu colo e não acreditava. “Você sabe quem você é?” sussurrou-lhe Moran. John gemeu e fez que sim com a cabeça. Foi seu último gesto. Quando chegaram à sala de emergência do Roosevelt Hospital, mais de 80% do volume de sangue de John se perdera através de sete graves ferimentos em seu pescoço e em seu ombro. Diversos cirurgiões e enfermeiras trabalharam em cima dele febrilmente durante meia hora. De acordo com o Dr. Stephen Lynn, diretor dos serviços de emergência do hospital, “não foi possível ressuscitá-lo por meio nenhum”. Quando o Dr. Lynn saiu para a sala de espera, Yoko lhe perguntou frenética: “Onde está meu marido! Ele ia querer que eu estivesse com ele!” “Temos muito más notícias”, disse-lhe o Dr. Lynn. “Infelizmente, apesar dos maiores esforços, seu marido está morto. Não houve sofrimento no final.” “O senhor quer dizer que ele estava dormindo?”, soluçou Yoko. Ela voltou para o Dakota pouco depois da meia-noite. Sozinha. Telefonou para três pessoas naquela noite. Telefonou para Julian, que perdera o pai que nunca pôde conhecer direito; telefonou para tia Mimi, que perdera o garotinho que um dia ela quis fingir que era filho dela mesma; e telefonou para Paul McCartney, e este por sua vez telefonou para os outros Beatles.
No dia 10 de dezembro, a seguinte carta apareceu nos jornais de todo o mundo. Era de Yoko e de Sean. “Eu contei a Sean o que aconteceu. Mostrei-lhe a foto de seu pai na primeira página do jornal e lhe expliquei a situação. Levei Sean ao local onde John caiu depois de ter sido ferido. Sean queria saber porque a pessoa atirara em John, se gostava dele. Eu lhe expliquei que provavelmente era uma pessoa muito confusa. Sean disse que precisávamos descobrir se ele era realmente uma pessoa confusa ou se ele de fato quisera matar John. Disse a ele que isso cabia ao tribunal. Ele perguntou que tribunal, se o de tênis ou de basquete (N. da R.: o trocadilho é intraduzível. Em inglês a palavra court significa tribunal, corte, e também significa quadra). Era assim que Sean costumava conversar com o pai. Eles eram amigos, colega. John teria ficado orgulhos de Sean se tivesse ouvido isso. Sean chorou depois. Ele também disse: “Agora papai é parte de Deus. Acho que quando você morre, você se torna muito maior, porque se torna parte de todas as coisas.” Yoko, publicamente, é muito filosófica sobre a morte de John. Quando lhe perguntaram por que todos os médiuns e astrólogos não os avisaram sobre a noite de 8 de dezembro sob as arcadas do edifício Dakota, ela respondeu que tinham avisado. Não a data específica, mas que John tinha má sorte em seu futuro. Alguns destinos, diz ela, não podem ser mudados.

FIM

Tradução de Eduardo Francis Alves

10 comentários:

  1. nossa, não sabia desse texto! muito bom...
    só tem uma coisa... Strawberry Fields Forever é do Magical Mystery Tour, e não do Sgt. Pepper's. Além disso, "I buried Paul" (eu enterrei Paul) pode ser ouvida quando tocada normalmente, e não de trás pra frente...
    Já no Sgt Pepper's, em a Day In The Life, no final, se girar o LP no sentido anti-horário, pode-se ouvir "Paul is Dead"...

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  2. Perdemos um genio,o fato de John ter dito que os Beatles eram conhecidos que Deus,não tem nada a ver como alguns grupos de Evangelicos diz,que ele provocou a ira Divina.E eles com suas canções as vezes beirando ao ridiculo, sera que Deus esta contente com tanta mediocridade de suas letras.Olhem estão vendendo a Fé.Fato que os Beatles nunca fizeram.

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  3. Ana, você tem razão quando diz que "Strawberry Fields Forever" saiu no "Magical Mystery Tour". No entanto, originalmente, quando ela foi concebida e gravada, a idéia deles era para que fosse lançada no Sgt. Peppers. Abraço, Carlos Cesar

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  4. Puxa vida, nunca lí tanto sobre John Lennon! parabéns Foi a melhor coisa que fiz, parar e entrar nesse Blog!

    'Todos noz Dizemos, Dê uma Chance a Paz"

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  5. Grande matéria finalmente achei um blog melhor que o DIÁRIO DOS BEATLES que também é bom mas não tem matérias boas e cumpridas como essa parabéns pelo site continue com seu trabalho maravilhoso enriquecendo nos beatlemaníacos com informações muito interessantes.
    OBRIGADA!

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  6. ´´Paul McCartney , ok?
    ´Pattie Boyd,ok?
    ´´George Harrison, ok? meu deus, nunca vi tantos erros em um texto, fora os outros que não citei, consertem isso aí.

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  7. ´´Paul McCartney , ok?
    ´Pattie Boyd,ok?
    ´´George Harrison, ok? meu deus, nunca vi tantos erros em um texto, fora os outros que não citei, consertem isso aí.

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  8. ´´Paul McCartney , ok?
    ´Pattie Boyd,ok?
    ´´George Harrison, ok? meu deus, nunca vi tantos erros em um texto, fora os outros que não citei, consertem isso aí.

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  9. Para mim, desculpe a sinceridade, Yoko tem parte na morte de John.

    Quem se beneficiou diretamente da morte dele? Resposta: Yoko. O que ela ganhou? Resposta: Além de todo o dinheiro de John, ela finalmente ganhou o carinho do público que sempre a tinha rejeitado. Além disso, ela não precisaria mais temer que John pudesse se divorciar dela e ela perdesse a fama e o poder que tinha controlando a fortuna de Lennon. (Ela tinha medo de John voltasse para Cynthia, caso voltasse p/ a Inglaterra). Ela não precisava mais lidar com a rebeldia ou carência sexual de John.(Eles mantinham no fim dos anos 70 um casamento de fachada). Ela não tinha mais que lidar com a família de John e amigos britânicos constantemente tentando contatá-lo. Enfim, com a morte de John, ela teve controle total do mito "Johh & Yoko" para moldar como bem entendesse. Inclusive a tragédia ajudou a alavancar seu single 'Walking On Thin Ice' ao sucesso para ajudá-la a se tornar uma estrela por si só.

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